Por Prof. Dr. Manoel Alves da Silva
Em novembro de 2025, a cidade de Belém do Pará — no coração da maior floresta tropical do planeta — sediará a 30ª Conferência das Partes sobre o Clima (COP 30). Trata-se de uma oportunidade histórica para reposicionar a Amazônia não apenas como um ativo ambiental global, mas como território vivo, habitado por milhões de pessoas que enfrentam desafios profundos e estruturais. Esta é a COP na Floresta, e não em uma favela de palafitas, como alguns discursos estereotipados ainda tentam sugerir. O compromisso com a sustentabilidade climática deve ser, antes de tudo, um compromisso com a justiça para quem vive na e da floresta — incluindo os povos originários, tradicionais e as populações urbanas da Amazônia.
Sustentabilidade com justiça social e territorial
A verdadeira sustentabilidade, aquela que prioriza os que estão em situações de risco e vulnerabilidade, deve incluir uma diversidade de sujeitos históricos da região: indígenas, ribeirinhos, extrativistas, quilombolas e também as populações urbanas da Amazônia. A construção de um futuro sustentável exige, portanto, investimentos em infraestrutura e políticas públicas de base, que vão muito além do discurso ecológico.
Entre as demandas urgentes, destacam-se:
- Saneamento básico: acesso universal à água potável, banheiros, redes de esgoto, drenagem e pavimentação;
- Infraestrutura urbana: iluminação pública, praças, áreas de lazer, esporte, cultura e educação;
- Políticas sociais: moradia digna, combate à pobreza extrema, à fome e à desigualdade estrutural.
Essas ações não se contrapõem à preservação ambiental. Pelo contrário: são condições essenciais para uma floresta protegida com seus povos vivendo com dignidade.
Amazônia em números: grandeza e vulnerabilidade
Com cerca de 5,5 milhões de km², a Amazônia ocupa 40% do território brasileiro (IBGE, 2023) e se estende por nove países da América do Sul. É berço da maior bacia hidrográfica do planeta, contendo aproximadamente 7 milhões de km² e responsável por 15% da água doce superficial do mundo (ANA – Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico, 2022).
A biodiversidade amazônica é extraordinária: há registro de mais de 40 mil espécies de plantas, 1.300 espécies de aves, 3 mil espécies de peixes e 3 mil espécies de insetos (WWF Brasil, 2021).
A Amazônia Legal concentra aproximadamente 25 milhões de habitantes (IBGE, Estimativas Populacionais, 2022), mais do que a população de países europeus como:
Dinamarca: 5,8 milhões
Finlândia: 5,5 milhões
Suíça: 8,7 milhões
Suécia: 10,3 milhões (Fonte: United Nations, Department of Economic and Social Affairs – Population Division, 2022 Revision)
Distribuição populacional da Amazônia Legal, por estado (IBGE, Estimativas Populacionais, 2022):
Amazonas: 4,2 milhões de habitantes
Pará: 8,7 milhões
Acre: 0,9 milhão
Amapá: 0,8 milhão
Rondônia: 1,8 milhão
Roraima: 0,6 milhão
Tocantins: 1,6 milhão
Maranhão (parcial): 7,2 milhões (população total do estado; parte está incluída na Amazônia Legal)
Mato Grosso (parcial): 3,7 milhões (idem)
Apesar de sua relevância ecológica e social, a região enfrenta déficits estruturais alarmantes. Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua) de 2019 (IBGE, 2020), apenas 58,4% da população da Amazônia Legal tinha acesso a redes de esgoto ou fossas sépticas. Outros 34,6% utilizavam fossas rudimentares ou não tinham acesso a nenhum tipo de saneamento.
O que a COP 30 precisa priorizar
A conferência climática em Belém deve ir além de promessas genéricas e abordar com firmeza temas centrais para a Amazônia:
- Cadeias produtivas sustentáveis: valorização da agricultura de base ecológica, da pecuária de baixo impacto e do manejo responsável dos recursos florestais;
- Bioeconomia: fomento à economia baseada em ativos biológicos, como fitoterápicos, biocombustíveis, alimentos naturais e cosméticos sustentáveis;
- Justiça climática: garantia de proteção, financiamento e compensações às comunidades mais afetadas pelos efeitos das mudanças climáticas;
- Equidade de gênero: valorização da participação das mulheres nas decisões socioambientais e nas estratégias de adaptação.
A floresta amazônica não é um espaço vazio à disposição do mercado ou da intervenção externa: ela é habitada, vivida, produzida e cuidada por uma diversidade de povos e culturas. A COP 30 tem a missão histórica de ouvir essas vozes e reconhecer que não haverá solução climática global sem justiça climática regional. Proteger a Amazônia é garantir vida, dignidade e futuro para todos.
Fontes consultadas:
IBGE (2022). Estimativas Populacionais dos Estados Brasileiros
IBGE (2023). Área da Amazônia e divisão político-administrativa
IBGE (2020). PNAD Contínua 2019 – Acesso a saneamento básico e infraestrutura urbana
ANA – Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (2022). Atlas da Bacia Amazônica
WWF Brasil (2021). Relatório de Biodiversidade da Amazônia
United Nations, DESA – Population Division (2022 Revision). World Population Prospects
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