Recebido com festa e trio elétrico, prefeito de Ananindeua volta ao cargo mesmo sob investigação por corrupção - Estado do Pará Online

Recebido com festa e trio elétrico, prefeito de Ananindeua volta ao cargo mesmo sob investigação por corrupção

Daniel, médico de formação e político que acumulou patrimônio milionário em pouco tempo de vida pública, diz ser alvo de perseguição e se declarou “emocionado” com a retomada do cargo. Para opositores, a volta precoce ao comando da prefeitura abre margem para interferência nas investigações e uso da máquina pública para autoproteção.

Dr Daniel Santos (PSB) é recebido com festa e trio elétrico após chegar no aeroporto de Belém e segue para Ananindeua com uma legião de apoiadores
Dr Daniel Santos (PSB) é recebido com festa e trio elétrico após chegar no aeroporto de Belém e segue para Ananindeua com uma legião de apoiadores. Foto: Reprodução/Whatsapp

A cena no aeroporto de Belém, na manhã desta sexta-feira (8), foi de campanha eleitoral antecipada — ainda que o personagem central estivesse longe das urnas e bem perto do banco dos réus. O prefeito de Ananindeua, Dr. Daniel Santos (PSB), foi recebido por uma multidão de apoiadores, que levaram bandeiras, gritos de “inocente” e até um trio elétrico contratado para embalar o cortejo. Da pista de desembarque, o gestor seguiu em carreata e motociata até o município, comemorando a decisão da Justiça Federal que o reintegrou ao cargo.

Entre os manifestantes no evento, sua esposa, a deputada federal Alessandra Haber (MDB) e o deputado estadual Bob Fllay (PRD), além de vereadores da base aliada de Daniel em Ananindeua, uma legião de assessores e servidores da prefeitura, assim como populares que o apoiam.

A festa, porém, contrasta com o pano de fundo judicial. Daniel Santos havia sido afastado do cargo por determinação do Tribunal de Justiça do Pará, no âmbito da Operação Hades, que apura um esquema de fraudes em licitações, corrupção e lavagem de dinheiro na Prefeitura de Ananindeua. A liminar do ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) suspendeu o afastamento, mas não encerrou as investigações — nem retirou as medidas de bloqueio de bens e de custódia de provas.

Em nota, o Ministério Público do Pará (MPPA) rebateu a narrativa de vitória definitiva disseminada por aliados do prefeito, lembrando que a decisão é provisória e que as acusações contra ele têm “robusta prova documental e depoimentos que colocam em xeque a honestidade e o vitimismo pregados nas redes sociais”. O órgão reforçou que seguirá “incansavelmente na defesa do patrimônio público e no combate à corrupção”.

Patrimônio milionário

Daniel, médico de formação e político que acumulou patrimônio milionário em pouco tempo de vida pública, diz ser alvo de perseguição e se declarou “emocionado” com a retomada do cargo. Para opositores, a volta precoce ao comando da prefeitura abre margem para interferência nas investigações e uso da máquina pública para autoproteção.

A semelhança com outros casos de políticos sob forte suspeita não passou despercebida. Assim como o ex-presidente Jair Bolsonaro, que recentemente escapou de medidas mais duras impostas pela Justiça, Daniel Santos se manteve distante da prisão e conseguiu evitar a perda total de poder. A diferença é que, no caso do prefeito, o afastamento era visto como o principal freio para impedir eventuais danos à administração durante a apuração.

Enquanto a Justiça decide seu destino, Daniel volta ao gabinete fortalecido pela imagem de “sobrevivente” e respaldado por uma base de apoiadores barulhenta — que, nesta sexta-feira, trocou o silêncio das salas de audiência pelo som alto do trio elétrico nas ruas de Ananindeua.

Bens apreendidos e provas de corrupção na gestão de Dr. Daniel Santos

O Ministério Público do Pará (MPPA) divulgou detalhes da Operação Aqueronte II / Hades, que afastou o prefeito de Ananindeua, Dr. Daniel Santos (PSB), e revelou um patrimônio considerado incompatível com sua declaração oficial de bens.

Principais apreensões e bloqueios:

  • R$ 500 milhões bloqueados de 16 pessoas físicas e jurídicas;
  • R$ 131 milhões em bens do prefeito congelados pela Justiça;
  • Fazenda em Tomé-Açu avaliada em R$ 16 milhões;
  • Aeronave de R$ 10,9 milhões (não apreendida até o momento);
  • Relógios de luxo (Rolex e Audemars Piguet) avaliados entre R$ 2,5 e R$ 4 milhões;
  • Maquinário agrícola, tratores e implementos;
  • Apartamento de luxo em Fortaleza (CE), onde foram localizados 17 relógios de alto valor;
  • Equipamentos eletrônicos e documentos que reforçam o esquema fraudulento.

Como funcionava o esquema, segundo o MPPA:

  • Uso da empresa JD Agropecuária, em nome do prefeito, como fachada para movimentações ilegais;
  • Editais de licitação entregues antecipadamente a empreiteiras favorecidas;
  • Empresas como Edifica Construtora, Everest Empreendimentos, Martins Engenharia, Autamed, JR Empreendimentos e DSL Construtora (esta última com R$ 127 milhões bloqueados) teriam pago bens pessoais do prefeito, incluindo a aeronave;
  • Depoimentos confirmam que empreiteiras pagavam despesas diretas de Daniel Santos.

Provas e testemunhos-chave:

  • Ex-proprietária da fazenda confirmou que parte do pagamento foi feito por empresas investigadas e contas da propriedade eram quitadas pela JD Agropecuária;
  • Empresário Ronaldo Souza relatou ter sido coagido a pagar despesas em nome do prefeito e, depois, recebeu R$ 800 mil da prefeitura;
  • Documentos e extratos bancários totalizando quase 400 páginas comprovam o esquema.

Outros pontos relevantes:

  • Em 2024, Daniel Santos declarou R$ 4,8 milhões em bens — quase 300% a menos que o patrimônio identificado na operação;
  • Investigação se concentra no período 2023-2025, mas pode retroceder para apurar esquemas mais antigos;
  • MPPA solicitou suspensão do sigilo processual;
  • Apesar das apreensões, nenhum valor em espécie foi localizado.

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