Olhos amputados: mutirão de cirurgia de catarata em Icoaraci termina em danos irreversíveis para idosos

Essas infecções ocasionaram a perda total da visão em alguns casos e até a amputação dos olhos.

Um mutirão realizado na clínica particular oftalmológica São Lucas, localizada no distrito de Icoaraci, em Belém, em parceria com o Sistema Único de Saúde (SUS), resultou em graves infecções para cerca de 23 pacientes que se submeteram a cirurgias de catarata. Essas infecções ocasionaram a perda total da visão em alguns casos e até a amputação dos olhos.

Em uma entrevista ao SBT Brasil, algumas pessoas falaram sobre as sequelas que a infecção deixou. Albanise Soares, de 65 anos, uma das vítimas, relatou que precisou amputar o olho após contrair a bactéria na clínica. Segundo ela, dias após o procedimento, passou por um transplante que não deu certo, resultando na necessidade de remover o olho.

“Não consome fazer mais nada sozinha”, diz a vítima.

Gabriela Soares, filha da vítima, expressou revolta com o caso: “Minha mãe foi para aquela clínica buscando qualidade de vida, e agora eu estou com uma mãe sem olho.”

Além de Albanise, mais de 40 pessoas também participaram do mutirão e pelo menos 23 delas apresentaram infecções severas.

Entre as vítimas também está Benedita da Silva, que esperou mais de um ano pela cirurgia e, quando realizou o procedimento, ficou praticamente sem enxergar. Sheyla Costa, filha de Benedita, também denuncia a falta de higiene da clínica, afirmando que os profissionais comiam dentro do bloco cirúrgico, além de haver insetos no local.

“Não consigo ler, não consigo ver televisão”, relata Benedita.

O oftalmologista Lauro Barata destacou a importância de seguir rigorosamente os protocolos de esterilização durante esses procedimentos.

“Um material utilizado em um paciente não pode ser usado em outro sem a devida esterilização”, afirma o especialista.

Em nota emitida à equipe de reportagem do SBT, a clínica se defendeu afirmando que está regularizada e segue todos os protocolos de controle de infecção hospitalar. Além disso, ofereceu suporte médico e financeiro às vítimas. Entretanto, muitos pacientes rejeitaram acordos extrajudiciais e 11 deles processaram a clínica buscando reparação por danos.

O caso está sendo investigado pela Polícia Civil e o Ministério Público instaurou um procedimento para apurar as denúncias. A assessoria do Conselho Regional de Medicina (CRM-PA) se pronunciou sobre o ocorrido.

“O Conselho Regional de Medicina do Estado do Pará informa que tomou conhecimento da situação ocorrida na Clínica São Lucas envolvendo aproximadamente 30 pacientes, os quais, após procedimento cirúrgico, ficaram com graves sequelas.

O fato será objeto de apuração por este Regional, sendo que foi realizada, na data de hoje (16/10), fiscalização in loco, cujo relatório será encaminhado as autoridades competentes para adoção das medidas que forem necessárias para coibir tais situações.

Ressaltamos que os procedimentos no CRM-PA tramitam sob sigilo”.



A Clínica São Lucas declarou em nota para o Estado do Pará Online (EPOL):

“As cirurgias não foram agendadas por meio de mutirão. Foram cirurgias de rotina da clínica, realizadas a partir de prévias consultas médicas com todos os pacientes.


As cirurgias ocorreram no mesmo dia, no período matutino e vespertino. Cada procedimento cirúrgico realizado tem duração média de 10 a 15 minutos. A clínica esclarece que já realizou mais de 100 mil procedimentos desta natureza em sua sede, ao longo de seus mais de 20 anos de existência e em cerca de 80 municípios do Estado, sendo este o primeiro evento registrado com estas características.


Inicialmente, destacamos que a Clínica e Maternidade São Lucas atua há mais de 20 (vinte) anos, realizando cirurgias oftalmológicas, em sua sede, no Distrito de Icoaraci, e em diversos municípios do interior do Estado.

A Clínica está regular perante os órgãos de fiscalização e cumpre rigorosamente os protocolos de prevenção e controle de infecção hospitalar, visando minimizar os riscos de contaminação e garantir a segurança dos pacientes, profissionais de saúde e visitantes. 


Estamos trabalhando em estreita colaboração com especialistas e autoridades em saúde para investigar cada caso individualmente e prestando todo o suporte necessário aos pacientes e familiares, inclusive em relação a pacientes com ações judiciais em curso.


Estamos empenhados em manter uma comunicação transparente durante todo este processo, resguardando, no entanto, a necessária confidencialidade quanto aos dados de nossos pacientes e ou situações conduzidas em conjunto com nossa assessoria jurídica em âmbito judicial ou extrajudicial”.

A SESMA também se posicionou sobre o ocorrido:

“A Secretaria Municipal de Saúde (Sesma) informa que em razão das recentes ocorrências, notificará formalmente a Clínica São Lucas, localizada no distrito de Icoaraci. A Sesma suspenderá preventivamente os encaminhamentos para realização de procedimentos oftalmológicos na clínica, e os pacientes serão direcionados a outros parceiros credenciados.

Além disso, o órgão de Vigilância Sanitária Municipal já esteve no estabelecimento e realizou uma inspeção preliminar para verificar as conformidades sanitárias do local.

O órgão municipal de Saúde afirma, ainda, que não houve falha no fluxo regulatório”.

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