Depois de mais de 30 anos de discussões, impasses e críticas, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) concedeu, nesta segunda-feira (26), a licença ambiental para a realização do derrocamento do Pedral do Lourenço, no município de Itupiranga, sudeste do Pará. A autorização permite o uso de explosivos para a retirada de rochas no leito do rio Tocantins, viabilizando a navegação de grandes embarcações no trecho e a instalação da hidrovia Araguaia-Tocantins.
A obra integra o pacote de investimentos do Novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e tem como objetivo tornar navegáveis os cerca de 35 quilômetros entre Santa Teresinha do Tauiri e a Ilha do Bogéa, mesmo durante o período de estiagem. A hidrovia permitirá o tráfego contínuo de comboios com cargas agrícolas, especialmente soja, entre Marabá e o porto de Barcarena, utilizando a eclusa de Tucuruí.
MPF aponta ilegalidade da licença
A decisão do Ibama, no entanto, gerou reação imediata do Ministério Público Federal (MPF). Em nota oficial, o órgão classificou a licença de instalação como ilegal e em desacordo com decisão judicial anterior, que impedia a concessão da autorização sem a apresentação de estudos sobre o desembarque pesqueiro na região.
Segundo o MPF, a liberação também descumpre condicionantes da licença prévia emitida em 2022 e fere o direito de consulta prévia, livre e informada de comunidades tradicionais, garantido pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que tem força de lei no Brasil.
Impactos e críticas de ambientalistas
Ambientalistas e ribeirinhos também expressaram preocupação com os impactos socioambientais da obra. O ambientalista Zé Carlos afirma que a explosão das rochas afetará diretamente o ambiente aquático do Pedral, onde diversas espécies de peixes e botos se reproduzem e se abrigam. “A navegação intensa vai modificar o ecossistema, prejudicar embarcações menores e afetar a biodiversidade de toda a região entre Tucuruí e Barcarena”, alertou.
Embora reconheça que o transporte hidroviário é mais eficiente e menos poluente que o rodoviário, ele cobra transparência e compensações reais para as populações impactadas. “Não pode ser uma obra que só beneficia os exportadores de grãos. É preciso garantir que o povo paraense também ganhe com isso”, defendeu.
Governo do Pará comemora
Na contramão das críticas, o governador Helder Barbalho (MDB) comemorou a decisão e disse que a licença “posiciona o Pará para garantir a navegabilidade do rio Tocantins o ano todo”, destacando o potencial da hidrovia para impulsionar a economia regional e gerar emprego e renda.
A licença do Ibama tem validade de cinco anos e estabelece a implementação de 32 planos e programas ambientais, além da proibição de retirada de vegetação nativa e fauna silvestre e da obrigatoriedade de destinação de R$ 4 milhões em compensações ambientais. A ordem de serviço para o início das obras deve ser assinada nos próximos dias.
Histórico do caso
O projeto de derrocamento do Pedral do Lourenço é debatido desde os anos 1990. Em 2009, a Justiça Federal acatou ação do MPF e impediu o fracionamento do licenciamento ambiental, após o Dnit ter iniciado trâmites paralelos no Ibama e na Semas (Secretaria de Meio Ambiente do Estado). A licença estadual foi anulada.
O Ibama voltou a analisar o processo em 2013, e uma licença prévia foi concedida apenas em 2022, com recomendação de suspensão por parte do MPF. Agora, com a licença de instalação emitida, o projeto avança, mas cercado de controvérsias jurídicas e socioambientais.
Leia também:
Deixe um comentário