A Câmara dos Deputados aprovou nesta quarta-feira (5) o Projeto de Decreto Legislativo (PDL) 3/2025, que anula a Resolução nº 258/2024 do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda). A norma tratava do atendimento a crianças e adolescentes vítimas de violência sexual, com regras para o acesso ao aborto legal previsto em lei. O texto segue agora para análise do Senado.
O que dizia a resolução do Conanda
A Resolução nº 258, publicada em janeiro de 2025, definia que o aborto legal em casos de estupro não dependeria de boletim de ocorrência, decisão judicial nem da autorização dos responsáveis legais quando houvesse suspeita de violência intrafamiliar. O objetivo, segundo o conselho, era evitar a revitimização e garantir atendimento humanizado e rápido a meninas em situação de vulnerabilidade.
O texto também previa o acionamento da Defensoria Pública e do Ministério Público em caso de divergência entre a vontade da vítima e a dos responsáveis, e classificava como conduta discriminatória — e não objeção de consciência — a recusa de médicos em realizar o procedimento por desconfiança da palavra da vítima.
Por que o Congresso derrubou a norma
O projeto de anulação foi apresentado pela deputada Chris Tonietto (PL-RJ) e recebeu parecer favorável do relator Luiz Gastão (PSD-CE). Os autores sustentam que o Conanda teria ultrapassado suas atribuições ao tratar de questões que, segundo eles, caberiam ao Congresso Nacional. Também criticaram a ausência de um limite gestacional para a realização do aborto, afirmando que a resolução poderia permitir o procedimento em estágios avançados da gravidez.
Durante o debate em plenário, deputados da base conservadora argumentaram que a medida abria brechas para “abusos” e enfraquecia a investigação de crimes sexuais. Otoni de Paula (MDB-RJ) e Sóstenes Cavalcante (PL-RJ) afirmaram que o conselho “não pode legislar sobre aborto” e que a dispensa do boletim de ocorrência impediria a punição dos agressores.
O contraponto do governo e da oposição
O Ministério das Mulheres e o Ministério dos Direitos Humanos divulgaram nota conjunta criticando a revogação da resolução, classificando o ato como um “retrocesso” na proteção de meninas e adolescentes vítimas de estupro. Para o governo, o texto do Conanda apenas detalhava direitos já previstos em lei, como o aborto legal em casos de estupro e o direito à escuta protegida.
Parlamentares da oposição, como Jandira Feghali (PCdoB-RJ) e Fernanda Melchionna (Psol-RS), defenderam a manutenção da norma. Elas argumentaram que, em muitos casos, o agressor é o próprio pai ou tutor, e que obrigar a autorização da família ou a apresentação de boletim de ocorrência expõe as vítimas a novas violências. “Ninguém faz apologia ao aborto. Trata-se de garantir o direito de meninas violentadas a não serem forçadas à maternidade”, afirmou Feghali.
Próximos passos
Como o projeto é um decreto legislativo, não precisa de sanção presidencial. Caso seja aprovado também pelo Senado, a resolução do Conanda será oficialmente sustada e deixará de ter efeito. Até lá, o impasse segue como mais um capítulo da disputa política e ideológica sobre o aborto legal no país — um tema que, apesar de previsto em lei há décadas, continua sendo alvo de controvérsia e resistência no Congresso.
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