O PT do Pará atravessa um dos momentos mais contraditórios de sua trajetória. A legenda que já governou Belém duas vezes e comandou o Estado hoje se vê dividida entre participar do núcleo de poder dominado pela família Barbalho e ensaiar um discurso de enfrentamento a essa mesma hegemonia. O dilema expõe tensões internas, desgaste de identidade e dificuldades de posicionamento no cenário regional.
Da referência de esquerda ao pragmatismo sem freio
Nascido no Pará sob forte influência de movimentos sindicais, pastorais e organizações populares, o PT se consolidou como contraponto aos grupos oligárquicos locais. Ao longo das décadas, construiu narrativa de autonomia frente ao poder tradicional e liderança em agendas sociais. Nesse período, simbolizava renovação política e combate a dinastias regionais.
Nos últimos anos, porém, o partido passou a atuar como aliado direto do grupo Barbalho, cuja predominância no Executivo estadual e capacidade de articulação com diversos segmentos institucionais moldam o ambiente político paraense. Para defensores, trata-se de uma aliança estratégica. Para críticos, o movimento representa afastamento das bases históricas e risco de diluição do projeto político do PT no Estado.
Entre cargos e rupturas em cidades-chave
A contradição central está no fato de que o PT-Pará detém cargos no governo estadual comandado por Helder Barbalho (MDB) e também ocupa espaços na prefeitura de Belém, administrada por seu primo Igor Normando (MDB), ambos representantes do mesmo grupo político. Ao mesmo tempo, o partido mantém presença na gestão de Ananindeua, sob comando de Dr. Daniel (PSB), que se posiciona hoje como principal voz de oposição ao projeto de poder dos Barbalho. Essa duplicidade, com integração ao governo estadual e municipal da capital e convivência com uma liderança municipal abertamente dissidente, evidencia o paradoxo petista: governar com o grupo hegemônico enquanto compartilha palanque com quem busca enfrentá-lo.
No diretório estadual, o bloco majoritário segue sob influência do senador Beto Faro (PT), identificado com a linha pragmática e alinhada ao governo. Já setores vinculados a lideranças históricas, como Paulo Rocha (PT) e Maria do Carmo (PT), preservam relação política com os Barbalho, mas sob clima de “separação de bens”. As correntes mais à esquerda rejeitam a aliança e apontam o risco de o partido se tornar satélite do grupo governante.
Disputa por hegemonia e cálculo para 2026
A crise interna ganhou força após o rompimento público de Dr. Daniel com Helder Barbalho. Em reunião interna do PSB, o prefeito afirmou que as eleições de 2026 não serão uma disputa entre esquerda e direita, mas entre quem é a favor ou contra a manutenção da família Barbalho no poder. A fala expôs o ambiente de polarização que atinge diretamente o PT e o obriga a definir seu lugar no tabuleiro.
O futuro do PT no Pará e o risco da irrelevância
Com a hegemonia do grupo Barbalho consolidada e a oposição ainda se reorganizando, o PT enfrenta um desafio coletivo: redefinir seu papel sem perder representatividade. Para parte da militância, a convivência simultânea com governo e oposição compromete o capital político e dilui a identidade histórica. Para outra ala, a manutenção do espaço institucional é fundamental para viabilizar políticas públicas e evitar isolamento.
A resposta desse impasse definirá se o PT do Pará continuará orbitando a estrutura dominante ou retomará sua capacidade de formular projeto próprio, capaz de reconectar-se com setores populares e disputar hegemonia no Estado.
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