MPF recomenda cotas raciais para cursos da Marinha Mercante no Ciaba, em Belém

Órgão cobra que a Marinha do Brasil adote políticas afirmativas no Centro de Instrução Almirante Braz de Aguiar, voltado à formação de profissionais para o setor marítimo privado

Fachada do Ciaba, em Belém (PA), com letreiro dourado da Marinha do Brasil e bandeira do Brasil hasteada ao centro.

O Ministério Público Federal (MPF) recomendou à Marinha do Brasil a criação imediata de cotas raciais para pessoas negras — pretas e pardas — nos cursos oferecidos pelo Centro de Instrução Almirante Braz de Aguiar (Ciaba), localizado em Belém (PA). A recomendação foi enviada nesta segunda-feira (7) e deve valer para todos os processos seletivos futuros do ensino profissional marítimo, incluindo formação para a Marinha Mercante.

MPF defende equidade racial também no setor privado

De acordo com o MPF, a ausência de ações afirmativas no Ciaba fere os princípios constitucionais da igualdade material e da equidade racial, mesmo que os cursos não sejam voltados ao ingresso na administração pública.

“O Estado deve combater o racismo em toda a sociedade, inclusive nas atividades de formação profissional para o setor privado”, afirmam procuradoras e procuradores que assinam a recomendação.

A Marinha havia informado ao MPF, no fim de fevereiro, que a questão ainda demandava análise técnica, justificando que os cursos do Ciaba são voltados ao setor mercante, e não a cargos públicos. O MPF, por sua vez, rebateu o argumento, citando o princípio da juridicidade, que exige que a atuação estatal esteja alinhada à Constituição e aos compromissos internacionais assinados pelo Brasil.

O MPF embasa sua recomendação em diversas legislações, convenções e precedentes judiciais:

  • Constituição Federal, que prevê a redução das desigualdades sociais;
  • Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial;
  • Convenção Interamericana contra o Racismo, firmada pelo Brasil em 2013;
  • Estatuto da Igualdade Racial (Lei 12.288/2010);
  • Lei nº 12.990/2014, que estabelece cotas para negros em concursos públicos federais;
  • Decisões do STF que reconhecem a constitucionalidade das cotas, inclusive nas Forças Armadas;
  • Sentença da Justiça Federal de SP, que determinou reserva de vagas raciais nos Colégios Militares.

Além disso, o órgão ressalta a disparidade entre o perfil racial da população paraense e a ausência de representatividade nos cursos do Ciaba. Segundo o Censo 2022, 69,9% da população do Pará é parda e 9,8%, preta.

MPF relembra Revolta da Chibata como símbolo histórico

A recomendação também cita a Revolta da Chibata, ocorrida em 1910, quando marinheiros negros protestaram contra castigos corporais na Marinha. O episódio, segundo o MPF, reforça a necessidade de uma postura ativa da Marinha na reparação histórica e no combate ao racismo estrutural.

“Se não tem uma dívida histórica, a Marinha do Brasil ao menos deve atuar de forma coerente com sua trajetória e o contexto social atual”, concluem os procuradores.

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