Facções ampliam domínio na Amazônia e avançam sobre áreas de garimpo e fronteira - Estado do Pará Online

Facções ampliam domínio na Amazônia e avançam sobre áreas de garimpo e fronteira

Estudo apresentado na COP30 mostra crescimento de 32% da atuação criminosa na região e alerta para conexão entre narcotráfico, violência e crimes ambientais.

Policía Federal / Divulgação

A presença de facções criminosas em áreas da Amazônia Legal avançou de forma expressiva no último ano e revela uma relação cada vez mais direta com atividades como garimpo ilegal, exploração mineral e outras práticas que pressionam o meio ambiente.

Um levantamento divulgado na última quarta-feira (19) pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, durante a COP30, em Belém, mostra que o crime organizado ampliou seu alcance territorial e passou a operar em 45% dos municípios da região.

O estudo expõe que grupos como Comando Vermelho (CV) e Primeiro Comando da Capital (PCC) têm explorado crimes ambientais como fonte de renda e meio para lavagem de dinheiro. “Essas organizações encontram nos garimpos ilegais e na degradação ambiental uma rota para ampliar seus lucros e sua influência”, afirmou Samira Bueno, diretora-executiva do FBSP, em entrevista à Agência Brasil.

Nos bastidores dessas operações, surgem relatos que escancaram a força das facções em comunidades isoladas. Em Alta Floresta, no Mato Grosso, trabalhadores do garimpo recebem mensagens pelo WhatsApp exigindo cadastro obrigatório e cobrança de mensalidades impostas pelo CV, segundo a Agência Brasil, que teve acesso ao conteúdo na íntegra. As mensagens detalham pagamentos, regras e ameaças para quem não aderir à estrutura criminosa, indo de roubo de equipamentos à destruição de balsas, além de risco de morte.

Segundo o estudo, a Amazônia Legal, que abrange nove estados, registrou aumento de 32% na presença de facções entre 2024 e 2025, passando de 260 para 344 municípios sob influência direta ou em disputa. São 17 organizações em atividade, entre grupos nacionais, regionais e estrangeiros. Além de CV e PCC, atuam também o Bonde dos 40, Primeiro Comando do Maranhão, Guardiões do Estado, Tropa do Castelar, além da venezuelana Tren de Aragua e do Estado Maior Central, da Colômbia.

O domínio territorial segue estratégias distintas. O CV, dominante em grande parte do eixo do rio Solimões, opera rotas fluviais e articula o escoamento da droga por portos de Manaus, Santarém, Barcarena, Belém e Macapá. Já o PCC aposta na internacionalização, ampliando o uso de pistas clandestinas em garimpos e rotas aéreas até o Suriname para envio ao mercado internacional.

Os impactos desse avanço aparecem nos índices de violência. Em 2024, os 772 municípios da Amazônia Legal registraram 8.047 mortes violentas, taxa de 27,3 por 100 mil habitantes, o equivalente a 31% acima da média brasileira. O Amapá lidera como estado mais letal, enquanto o Maranhão foi o único da região a registrar aumento nas taxas de homicídio.

Entre os municípios mais críticos está Vila Bela da Santíssima Trindade (MT), que viu o número de assassinatos saltar de 12 para 42 em dois anos, impulsionados pelo avanço do CV em áreas próximas à fronteira com a Bolívia e dentro da Terra Indígena Sararé, onde o garimpo ilegal cresce de forma acelerada. “O que vemos ali é o modelo de controle armado que se consolidou no Rio de Janeiro sendo replicado na floresta”, avaliou Samira.

A violência contra mulheres também acende alerta. A região registrou 586 assassinatos femininos em 2024, taxa 21,8% superior à nacional. Mato Grosso é o estado mais perigoso para mulheres, e o Maranhão apresentou o maior aumento anual. Samira reforça que o enfrentamento à violência precisa ser adaptado às realidades amazônicas. “Os modelos tradicionais não dialogam com aldeias indígenas, municípios de fronteira ou áreas isoladas. Precisamos de políticas que compreendam essas especificidades”, disse.

A expansão das facções, associada à degradação ambiental, coloca desafios ao Estado brasileiro em um momento em que o debate climático domina a COP30. “Não existe transição energética ou justiça climática possível sem segurança e cidadania nos territórios”, concluiu Samira Bueno, em entrevista à Agência Brasil.

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