Por Manoel Alves*
No momento em que Belém é alvo de críticas contundentes — por suas contradições, desigualdades, carência de infraestrutura hoteleira e urbana, pela ausência de obras de saneamento, e por expressões concretas de racismo ambiental, de gênero e etário — é preciso afirmar: tudo isso é verdade. Mas é justamente essa visibilidade que torna legítima e necessária a realização da COP 30 na Amazônia urbanizada.
Belém não representa uma Amazônia idealizada. Representa a Amazônia urbana sem urbanização plena — onde a cidade cresce, mas sem garantir direitos, infraestrutura e justiça. Um território marcado por contrastes entre a floresta e o concreto, entre o discurso e a realidade da exclusão social. Ao expor suas feridas, Belém denuncia o que precisa ser transformado — e por isso deve ser não apenas palco de debates, mas território real de enfrentamento e mudança.
A realização da COP 30 em Belém ultrapassa a retórica ambiental. Inscreve-se num campo mais profundo, onde se entrelaçam interesses políticos, econômicos, raciais e territoriais. Trata-se de um território simbólico e material onde a crise climática se revela não apenas nos índices, mas nos corpos, nas periferias, nos alagamentos, na ausência de saneamento, na insegurança alimentar e na exclusão histórica de povos e comunidades.
É nesse cruzamento de desigualdades e potências que Belém se apresenta como a verdadeira capital das contradições da Amazônia. Querer ocultar, omitir ou retirar a COP de Belém sob o argumento da existência dessas desigualdades e contradições é uma higienização socioambiental e racial.
A COP 30 em Belém não é um erro, é uma oportunidade histórica: de denunciar, de construir e de transformar a Amazônia urbana num espaço legítimo de justiça climática e sustentabilidade socioambiental.
*Manoel Alves da Silva é professor, sociólogo e doutor em Ciências Socioambientais
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