Durante o segundo dia da Cúpula dos Líderes da 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP 30), realizada nesta sexta-feira (7), em Belém, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva defendeu que as próximas decisões sobre o setor energético serão determinantes para o futuro do planeta. Ele ressaltou que uma transição energética justa e inclusiva é essencial para conter os efeitos da crise climática e destacou o protagonismo do Brasil em fontes limpas e renováveis.
Lula abriu seu discurso afirmando que a transição energética está no centro da agenda global e que as escolhas feitas agora definirão o sucesso ou o fracasso no enfrentamento da mudança do clima. “As decisões que tomarmos com relação ao setor energético definirão nosso sucesso ou nosso fracasso na batalha contra a mudança do clima”, declarou. O presidente também lembrou o compromisso firmado na COP 28, em Dubai, quando os países concordaram em conduzir uma transição energética justa, ordenada e equitativa — compromisso que, segundo ele, ainda enfrenta grandes desafios.
Brasil como exemplo de energia limpa
O presidente ressaltou que o Brasil já é uma referência internacional na produção de energia sustentável. Ele citou que 90% da matriz elétrica brasileira é composta por fontes renováveis e relembrou o histórico pioneirismo do país em biocombustíveis e motores flex, desde a década de 1970.
“O Brasil não tem medo de discutir a transição energética”, disse Lula, enfatizando o papel nacional na consolidação de alternativas limpas e no desenvolvimento de tecnologias voltadas à sustentabilidade.
Durante o discurso, Lula também anunciou a criação de um fundo destinado ao enfrentamento das mudanças climáticas e à promoção da justiça climática, voltado para financiar tecnologias sustentáveis e fortalecer o papel do Brasil no combate à crise ambiental.
Desigualdade e pobreza energética
Lula alertou que a transição energética global não será possível sem enfrentar o problema da pobreza energética, que ainda afeta bilhões de pessoas. “Dois bilhões de pessoas não têm acesso a combustíveis adequados para cozinhar, e 660 milhões ainda dependem de lamparinas ou geradores a diesel nas periferias das grandes cidades”, afirmou.
O presidente reforçou que o acesso à energia é condição básica para o desenvolvimento social e econômico, e defendeu que os países em desenvolvimento tenham acesso facilitado a financiamento e tecnologia. Ele também propôs direcionar parte dos lucros obtidos com a exploração de petróleo para custear ações de transição energética nos países do Sul Global.
Chamado à cooperação global
Ao longo do pronunciamento, Lula apresentou dados preocupantes sobre o aumento das emissões de carbono do setor energético e criticou os subsídios ainda destinados aos combustíveis fósseis. Ele destacou que, em 2024, as emissões atingiram o maior nível desde 1957 e que os grandes bancos continuam investindo bilhões no petróleo e gás.
Para o presidente, é hora de os líderes mundiais assumirem compromissos concretos. Lula defendeu a implementação do acordo de Dubai, que prevê triplicar a geração de energia renovável e dobrar a eficiência energética até 2030, além de incluir metas de acesso universal à eletricidade e à cocção limpa.
“Os cientistas já cumpriram seu papel. Agora, cabe aos líderes decidir se o século XXI será lembrado como o século da catástrofe climática ou da reconstrução inteligente”, concluiu.
Veja abaixo a íntegra do discurso
As decisões que tomarmos com relação ao setor energético definirão nosso sucesso ou nosso fracasso na batalha contra a mudança do clima. Foram necessárias 28 COPs do clima para nos comprometermos, em Dubai, com uma transição energética justa, ordenada e equitativa. A Terra não comporta mais o modelo de desenvolvimento baseado no uso intensivo de combustíveis fósseis que vigorou nos últimos 200 anos. 75% das emissões de gases do efeito estufa têm origem na produção e no consumo de energia.
Não podemos nos omitir ou intimidar diante da magnitude desse dado.
Já sabemos que não é preciso desligar máquinas e motores, nem fechar fábricas ao redor do mundo de um dia para o outro.
A ciência e a tecnologia nos permitem evoluir de forma segura para um modelo centrado nas energias limpas. Essa transformação já está em curso. O uso de renováveis triplicou nos últimos dez anos.No primeiro semestre de 2025, a energia renovável se tornou a maior fonte individual de geração de eletricidade no mundo, ultrapassando o carvão. Em muitas regiões, as energias solar e eólica já são mais baratas do que a gerada por combustíveis fosseis. O preço das baterias caiu 90%. O Brasil não tem medo de discutir a transição energética.
Somos líderes nessa área há décadas. Ainda nos anos 1970, fomos o primeiro país a investir em larga escala em alternativas renováveis. 90% da matriz elétrica nacional provém de fontes limpas. Também somos pioneiros no desenvolvimento de motores flexíveis e o segundo maior produtor mundial de biocombustíveis.
Nossa gasolina tem 30% de etanol em sua composição e nosso diesel conta com 15% de biodiesel. O etanol é uma alternativa eficaz e imediatamente disponível para adoção nos setores mais desafiadores, como a indústria e os transportes. É lamentável que pressões e ameaças tenham levado a Organização Marítima Internacional a adiar esse passo.A transição energética representa um novo paradigma de desenvolvimento e uma grande oportunidade para promover transformações estruturais na sociedade e na economia. Em 2023, o setor foi responsável por 10% do crescimento do PIB global e empregou 35 milhões de pessoas. É impossível discutir a transição energética sem falar dos minerais críticos, essenciais para a confecção de baterias, painéis solares e sistemas de energia. Para gerar emprego e renda e gozar de segurança energética, os países em desenvolvimento precisam participar de todas as etapas dessa cadeia global de valor.Senhoras e senhores,Apesar dos avanços, 2024 registrou novo recorde de emissões de carbono do setor energético, o maior índice desde 1957. Os incentivos financeiros muitas vezes vão no sentido contrário ao da sustentabilidade. No ano passado, os 65 maiores bancos do mundo se comprometeram a conceder 869 bilhões de dólares para o setor de petróleo e gás. Desde a adoção do Acordo de Paris a participação dos combustíveis fósseis na matriz energética global diminuiu apenas de 83% para 80%.
O conflito na Ucrânia reverteu anos de esforços para redução de emissões de gases de efeito estufa e levou à reabertura de minas de carvão. Gastar com armas o dobro do que destinamos à ação climática é pavimentar o caminho para o apocalipse climático.Não haverá segurança energética em um mundo conflagrado. É fundamental combater todas as formas de pobreza energética. 2 bilhões de pessoas não têm acesso a combustíveis adequados para cozinhar. 660 milhões de pessoas dependem de lamparinas ou de geradores a diesel nas periferias das grandes cidades e nas comunidades rurais da América Latina, da África e da Ásia. 200 milhões de crianças frequentam escolas sem acesso à luz elétrica.
Sem energia, também não há conexão digital, hospitais funcionando ou agricultura moderna.
Sem equacionar a injustiça de dívidas externas impagáveis e sem abandonar condicionalidades que discriminam os países em desenvolvimento, andaremos em círculos. Um processo justo, ordenado e equitativo de afastamento dos combustíveis fósseis demanda o acesso a tecnologias e financiamento para os países do Sul Global.
Há espaço para explorar mecanismos inovadores de troca de dívida por financiamento de iniciativas de mitigação climática e transição energética. Direcionar parte dos lucros com a exploração de petróleo para transição energética permanece um caminho válido para os países em desenvolvimento. O Brasil estabelecerá um Fundo dessa natureza para financiar o enfrentamento da mudança do clima e promover justiça climática.O mundo precisa de um mapa do caminho claro para acabar com essa dependência dos combustíveis fósseis. É tempo de diversificar nossas matrizes energéticas, ampliar as fontes renováveis e acelerar a produção e o uso de combustíveis sustentáveis. Isso requer alguns compromissos centrais:
Em primeiro lugar: implementar o acordo de Dubai de triplicar a energia renovável e de dobrar a eficiência energética até 2030.
Em segundo lugar: colocar a eliminação da pobreza energética no centro do debate e incluir metas de cocção limpa e de acesso à eletricidade nos planos climáticos nacionais.
Em terceiro lugar: aderir ao Compromisso de Belém para quadruplicar o uso de combustíveis sustentáveis até 2035 e acelerar a descarbonização dos setores mais desafiadores.
Os cientistas já cumpriram seu papel. Nesta COP, os negociadores devem buscar o entendimento. E nós, os líderes, devemos decidir se o século XXI será lembrado como o século da catástrofe climática ou como o momento da reconstrução inteligente.
Muito obrigado.









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