A história da devoção a Nossa Senhora de Nazaré começa muito antes de Belém do Pará se tornar palco da maior romaria católica do país. Segundo registros e tradições, a sagrada imagem tem origem na antiga cidade de Nazaré, em Israel, e remonta aos primeiros séculos do Cristianismo.
A escultura, uma pequena figura de madeira que retrata Maria, de cor escura, amamentando o Menino Jesus, teria percorrido um longo caminho pela cristandade até chegar à Península Ibérica. Passou por Mérida, na Espanha, antes de se estabelecer, no ano de 711, na vila portuguesa que hoje leva seu nome: Nazaré.
No século XII, a imagem se tornaria símbolo de fé e milagre. O cavaleiro D. Fuas Roupinho, ao perseguir um cervo à beira de um penhasco, foi salvo por intercessão da Virgem. Em agradecimento, mandou erguer a Capela da Memória, em 1182, sobre a gruta onde a imagem era venerada.
A devoção cresceu, e em 1377 o rei D. Fernando fundou o Santuário de Nossa Senhora da Nazaré, marco do culto português que, até hoje, reúne fiéis em setembro no Sítio da Nazaré, durante o tradicional Círio da Prata Grande.
Da Nazaré portuguesa à Amazônia
Centenas de anos depois, no século XVII, missionários jesuítas trouxeram a devoção mariana para o norte do Brasil. A fé atravessou o Atlântico e encontrou novo lar na Amazônia. A versão mais conhecida da história conta que, por volta de 1700, um caboclo chamado Plácido, descendente de portugueses e indígenas, encontrou às margens do igarapé Murutucu, atual bairro de Nazaré, em Belém, uma pequena imagem de Nossa Senhora, semelhante à venerada em Portugal.
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— Portal Estado do Pará Online (@Estadopaonline) October 9, 2025
Plácido levou a escultura para casa e montou um altar, mas, misteriosamente, a imagem desaparecia e voltava ao local onde havia sido encontrada. O episódio foi interpretado como um sinal divino, levando o caboclo a construir uma pequena ermida no ponto do achado.
A notícia do milagre se espalhou e chegou às autoridades coloniais, que tentaram levar a imagem para o Palácio do Governo. Mais uma vez, a Virgem retornou à origem, reforçando a crença popular de proteção sobre o povo paraense.
O local da antiga ermida abriga hoje a imponente Basílica Santuário de Nossa Senhora de Nazaré, centro da maior manifestação religiosa do Norte do país.
O nascimento do Círio
Em 1773, o bispo João Evangelista Pereira da Silva declarou Belém sob a proteção da Virgem. No ano seguinte, a imagem foi enviada a Portugal para restauração e voltou em outubro, conduzida em procissão por fiéis e autoridades. O percurso, do porto até a capela, deu origem ao primeiro Círio de Nazaré, tradição que, desde então, se repete todos os segundos domingos de outubro.
Milagres atribuídos à santa reforçaram ainda mais a devoção. Um dos mais famosos envolve o brigue português São João Batista, que naufragou em 1846 após partir de Belém rumo a Lisboa. Todos os passageiros foram salvos por um bote, o mesmo que, segundo a crença, havia levado a imagem ao navio durante a restauração em 1774.
Desde 1885, esse bote passou a acompanhar simbolicamente a procissão, lembrando o episódio que uniu fé e sobrevivência.
De Saquarema a Belém: ecos da mesma fé
Embora o Círio paraense seja o mais famoso, o mais antigo do Brasil nasceu no século XVII, em Saquarema (RJ). Lá, pescadores encontraram a imagem de uma Virgem nos penedos que separam o mar da lagoa. Como na história de Plácido, a imagem também retornava milagrosamente ao local original, inspirando a construção de uma capela.
Séculos depois, em 2009, a imagem peregrina de Belém visitou Saquarema, selando o reconhecimento histórico de que a fé em Nossa Senhora de Nazaré, seja em Portugal, no Pará ou no Rio de Janeiro, partilha da mesma origem e da mesma devoção que atravessou oceanos e gerações.
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