Reunião, Clube do Remo, torcida organizada e jogadores: instituição desmoralizada?

Membros de torcidas organizadas estiveram no Estádio Banpará Baenão para uma conversa com os jogadores do clube e o executivo de futebol Sérgio Papellin.

Reprodução/Instagram. Violência, torcida e reunião no Clube do Remo.

Imagine estar em seu ambiente de trabalho após um treinamento físico cansativo, e então ter o local invadido por várias pessoas cobrando melhor desempenho em seu trabalho, mesmo sem terem qualquer vínculo com sua atividade profissional e por vezes terem causado prejuízos nas mesmas.

Foi justamente isso que aconteceu nesta quarta-feira (24), no Núcleo Azulino de Saúde e Performance (Nasp), localizado no Estádio Banpará Baenão, casa do Clube do Remo. Membros de torcidas organizadas estiveram no local para uma conversa com os jogadores do clube e o executivo de futebol Sérgio Papellin, tudo autorizado pela diretoria Azulina, comandada por Antônio Carlos Teixeira, o Tonhão, presidente do clube.

Reprodução. Uma das torcidas organizadas do Clube do Remo após reunião com diretoria e jogadores.


A atitude da diretoria pode, de alguma forma, afetar o elenco, já que é mais um motivo de pressão para os jogadores em um time que não começou bem o Campeonato Brasileiro da Série C e está com o trabalho em curso do técnico Gustavo Morínigo, que passa a ter que olhar para fatores externos ao desempenhar a função na equipe.

DIA DE TERROR

Voltando um pouco no tempo, chegamos até o dia 4 de fevereiro, quando foi realizado primeiro Re-Pa de 2024. Na ocasião, o Mangueirão ficou repleto com as duas torcidas, que celebraram intensamente nas arquibancadas. Entretanto, apenas momentos após o jogo, conflitos entre torcedores foram registrados em diversos pontos de Belém e Região Metropolitana, chegando a resultar em um óbito.

Thiago Aryan Silva era membro de torcida organizada e morreu durante um desses confrontos, sendo espancado até a morte por rivais. Imagens divulgadas posteriormente nas redes sociais mostraram a face do torcedor totalmente desfigurada, mostrando a selvageria com que ele foi assassinado.

Reprodução. Thiago Aryan Silva, torcedor morto no primeiro Re-Pa de 2024.

Após o registro desses e de outros conflitos, o Departamento Geral de Operações da Polícia Militar, através da Secretaria de Estado de Segurança Pública e Defesa Social, informou a Leão e Papão que as organizadas de ambos os clubes estão suspensas por seis jogos.

REUNIÃO PACÍFICA

Voltando a esta quarta-feira, a reunião teve um tom de apoio ao time, mas ao mesmo tempo de cobrança pelos últimos resultados obtidos em campo, sobretudo a derrota na estreia da Série C 2024 para o Volta Redonda, dentro de casa, por 2 a 1.

Mas será que é realmente necessária a ida de membros de torcidas organizadas, que costumeiramente são punidos por cânticos homofóbicos nos estádios, episódios de violência e insegurança aos demais torcedores? Que moral teriam para fazer quaisquer cobranças ao clube?

Por conta de episódios criminosos, a Polícia Civil, por meio da Diretoria de Operações Especiais em conjunto com a Divisão de Homicídios, deflagrou no dia 10 deste mês a “Operação Cartão Vermelho”, quando foram cumpridos 25 mandados de prisão, entre temporárias e preventivas, além do cumprimento de 28 mandados de busca e apreensão pelos crimes de homicídios, lesão corporal e fabricação de artefatos explosivos. Grande parte das apreensões foram feitas nas próprias sedes das torcidas.

Entre os presos estão os suspeitos de envolvimento nas mortes de Thiago Aryan Silva e Silva e José Carlos Oliveira da Silva – morto supostamente pelo “tribunal do crime” e ligado às brigas envolvendo torcidas organizadas no dia 4 de fevereiro deste ano. As investigações também apuraram torcedores que produzem, vendem ou compram bombas de fabricação caseira para cometer ataques em dias de jogos.

Em contato com a reportagem, o Clube do Remo informou que o encontro foi de forma pacífica e ordeira, sem qualquer risco a integridade física dos jogadores remistas.

O encontro desta quarta não é novidade. Há quase um ano, em 2023, alguns torcedores dirigiram-se à sala de imprensa do Baenão para pressionar o time por resultados. Na ocasião, os principais alvos foram o goleiro Vinicius e o atacante Muriqui, os quais dialogaram com os torcedores.

PAPELLIN, O FORTALEZA E O “CORTE” DE TORCIDAS ORGANIZADAS

Representando a diretoria azulina na reunião com os torcedores desta quarta, Papellin já foi esteve à frente de outro clube que precisou lidar com problemas com torcidas organizadas, mas que buscou uma solução diferente.

Reprodução/Instagram. Papellin na época de Fortaleza.

Em 30 de setembro de 2023, o Fortaleza, que na época tinha Papellin como executivo de futebol, anunciou o rompimento de qualquer vínculo com a Torcida Irmandade Tricolor (anteriormente conhecida como Jovem Garra Tricolor) e Torcida Unida do Fortaleza (TUF).

Organizadas do Fortaleza entram em conflito e paralisam jogo contra Sport no ano passado.

A decisão foi motivada pelos episódios de violência envolvendo as organizadas, incluindo tumultos em São Paulo durante a semifinal da Sul-Americana contra o Corinthians. As disputas entre as organizações vinham sendo motivo de preocupação há mais de um ano.

O conflito entre a TUF e a JGT é atribuído a uma “disputa de ego”, relacionada à hierarquia e ocupação de espaços nos estádios. A TUF, devido ao seu maior número de membros e antiguidade, reivindica o direito de posicionar suas faixas nos melhores lugares das arenas esportivas. Já a JGT, não aceitando as exigências da TUF, chega mais cedo para instalar suas próprias faixas.

MEDIDAS TOMADAS PELO FORTALEZA

  • Suspensão da cessão de ingressos para venda pelas torcidas organizadas;
  • Suspensão das cortesias de ingressos para membros das torcidas;
  • Fim do apoio financeiro para viagens das torcidas em jogos fora do estado;
  • Proibição do uso de símbolos do Fortaleza Esporte Clube pelas torcidas, sujeito a processo judicial em caso de descumprimento.

Em novembro de 2023, o Fortaleza permitiu o retorno das torcidas organizadas aos jogos, após acordo em reunião com representantes do Ministério Público do Ceará. Foi estipulado que os grupos deveriam realizar ações de conscientização contra a LGBTFobia e promover a cultura de paz. O MP também exigiu a entrega da lista completa de associados das TO’s.

No entanto, uma briga entre as torcidas organizadas do Fortaleza ocorreu no Centro de Formação Olímpica (CFO) no dia 3 de março de 2024 , durante uma partida de futsal. O clube anunciou a suspensão indeterminada das duas torcidas de todas as atividades do Fortaleza.

O tumulto teve início durante o intervalo do jogo e envolveu torcedores vestindo camisas da Força da Galera (antiga Torcida Uniformizada do Fortaleza – TUF) e Irmandade Tricolor (antiga Jovem Garra Tricolor – JGT). Membros das torcidas foram retirados do ginásio pela polícia militar devido ao tumulto. A partida terminou com a vitória do Fortaleza por 7 a 2 sobre o Russas, pela Copa do Estado.

Leia também: