A Polícia Federal, em parceria com a Controladoria-Geral da União (CGU), deflagrou na última terça-feira (29) a Operação Korban, que apura suspeitas de desvio de recursos públicos envolvendo emendas parlamentares direcionadas à realização de eventos de esportes digitais. O foco da investigação são contratos firmados entre o Ministério do Esporte e a Associação Moriá, sediada no Distrito Federal.
Segundo as investigações, cerca de R$ 15 milhões em recursos federais foram repassados à ONG para a realização dos chamados Jogos Estudantis de Esportes Digitais (Jedis), entre 2023 e 2024. A pasta, atualmente sob o comando do deputado licenciado André Fufuca (PP), afirmou por meio de nota que “acompanha e apoia integralmente” a operação, e ressaltou que as emendas sob suspeita são impositivas, ou seja, de execução obrigatória, com destinação definida pelos próprios parlamentares.
A operação, autorizada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), cumpriu 17 mandados de busca e apreensão em endereços ligados à ONG, seus dirigentes, empresas subcontratadas e sócios, nos estados do Acre, Paraná, Goiás e no próprio Distrito Federal.
Emendas parlamentares sob suspeita
As emendas que deram origem aos repasses foram de autoria do senador Izalci Lucas (PL-DF) e da ex-senadora Rose de Freitas (MDB-ES). Apesar disso, ambos não foram alvos diretos da operação. Izalci foi procurado pela reportagem, mas ainda não se manifestou.
De acordo com os investigadores, há indícios de pelo menos três tipos de fraudes nos convênios analisados. Um dos principais pontos envolve o direcionamento indevido nas subcontratações da ONG, com vínculo cruzado entre seus dirigentes e três das principais empresas terceirizadas. Orçamentos forjados, cotações manipuladas e propostas com indícios de falsificação também foram detectados.
As autoridades apontam ainda um possível conluio entre empresas terceirizadas, com sinais de que elas teriam simulado concorrência entre si para inflar os contratos — tudo com a possível anuência da própria Associação Moriá.
Empresas de fachada e aluguel superfaturado
Duas das empresas subcontratadas se destacam por apresentar características típicas de empresas de fachada: não têm sede compatível com a atividade, não possuem funcionários registrados e não demonstram histórico de prestação de serviços.
Um dos casos mais alarmantes envolve o aluguel de computadores para os eventos, cujos valores chegaram a ser onze vezes maiores que o custo de aquisição dos equipamentos. Outro ponto que chamou atenção foi o alto gasto com festas: cerca de 40% das verbas das emendas foram usadas em cerimônias de abertura e encerramento.
Ao longo dos últimos três anos, a Associação Moriá recebeu mais de R$ 90 milhões em 26 emendas parlamentares, destinadas a atividades que vão de competições de eSports a ações de controle de zoonoses no Acre. Apesar do volume expressivo de recursos, a entidade tem um histórico de atuação discreto, com origem em Anápolis (GO).
Medidas judiciais e bloqueio de bens
O STF também determinou o sequestro de bens móveis e imóveis, além do bloqueio de contas bancárias das empresas envolvidas. A CGU estima que os valores bloqueados podem chegar a R$ 25 milhões, como forma de garantir o ressarcimento aos cofres públicos.
A Associação Moriá já era uma das entidades listadas em um relatório da CGU que mapeava ONGs com uso suspeito de recursos provenientes de emendas parlamentares. De acordo com o relatório, apenas dois dos convênios da Moriá continham R$ 1,7 milhão em despesas “evitáveis”, com falhas na análise crítica dos orçamentos por parte do governo federal.
Suspensão dos repasses
O Ministério do Esporte afirmou que, assim que tomou conhecimento das suspeitas levantadas por sua equipe técnica, determinou a suspensão imediata de qualquer novo repasse à associação investigada. A pasta reiterou seu compromisso com a apuração dos fatos e a transparência na aplicação de recursos públicos.
A investigação segue em curso, e novas diligências não estão descartadas. A operação representa mais um capítulo no esforço das autoridades para coibir o uso indevido de emendas parlamentares, especialmente quando intermediadas por entidades privadas sem capacidade comprovada para executar os projetos financiados.
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