O discurso ecológico do Pará é para valer?

populares, membros do MAB, do MAM e outras organizações sociais, em frente a sede da Hydro Alunorte, em Barcarena, em protesto pelo cumprimento efetivo TAC e a inclusão de algumas comunidades que também foram impactas pelo lançamento clandestino de efluentes não tratados no Rio Murucupí (Foto: Cícero Pedrosa Neto/Amazônia Real).

Por Lúcio Flávio Pinto, em Amazônia Real

O Tribunal de Recursos Administrativos Ambientais do Estado do Pará, o mais desmatado do Brasil, só realizou em maio a sua primeira reunião ordinária de 2023. Não por falta de assunto. Na pauta constavam 161 processos referentes a crimes ecológicos. Os resultados das deliberações só foram publicados hoje, um mês e meio depois de adotadas, no Diário Oficial, a partir de quando começam a vigorar.

Quantas decisões chegarão a ser consumadas? Pelos acórdãos emitidos pelo tribunal, poucas, raras – quem sabe, nenhuma. Dos 161 casos julgados, 92 deles já tinham perdido a validade, por terem se passado mais de cinco anos da aplicação das multas pela própria Secretaria de Meio Ambiente e Sustentabilidade do Estado, à qual o tribunal se vincula.

Um caso era o mais remoto, de 2007. Três de 2008, quatro de 2009, um de 2010 e de 2011, quatro de 2012 e de 2013, seis de 2014 e 32 de 2015, dentre os mais antigos. Deverão se tornar prescritos mais 26 de 2016, 15 de 2017 e 17 de 2018.

Dentre as empresas que cometeram crime ecológico, mas não serão punidas, favorecidas pela prescrição intercorrente, estão a Mineração Paragominas, da multinacional norueguesa Norsk Hydro, que extrai bauxita (e ela própria transforma em alumina e alumínio no Pará); a mineradora Vale, a maior do Brasil e do Estado, que explora as ricas jazidas de Carajás; a Guamá Tratamento de Resíduos, que trata o lixo da área metropolitana de Belém, com quatro processos na pauta do tribunal: a Soenergy Sistema Internacional de Energia (três processos); a Brasil Biofuels, com processo de 2014; a Jari Celulose e Embalagem, com autos de 2015. Também órgãos do governo, como a Eletronorte, com dois processos, e prefeituras do interior.

Leia também:

Os governos, os interesses multinacionais e a pauta ambiental na Amazônia: Muito discurso e pouca ação

Recomendou a manutenção da interdição temporária das atividades incidentes sobre a área desmatada e diligência “para verificação da linha do tempo do desmatamento e o responsável por ele”. Naturalmente, terá que haver novas diligências ao local. Por mais quanto tempo?

Essa impunidade contrasta com a imagem que o governador Helder Barbalho, do MDB, projeta da sua administração, como empenhada em combater os delitos ambientais, ao contrário da maioria dos governos da Amazônia, que colocam a questão em segundo plano ou não a consideram prioritária. A lentidão dos julgamentos e a ineficácia dos autos de infração levam à sensação de impunidade dos infratores e alimentam o ceticismo sobre os efeitos concretos do discurso ecológico do governo paraense.

Esse empenho ajudou Belém a se tornar a sede da COP30, que se realizará em 2025. Mas a lentidão em efetivar as punições aos infratores e provocar a nulidade dos autos de infração e da aplicação das multas são fatores que questionam a efetividade do discurso ecológico do governo paraense.

Leia também:

COP30: Os desafios, os ganhos e enganos para Belém

COP-30: Quem vem dizer o que temos que fazer, tá fazendo o que para preservar o meio ambiente?