A crise climática — marcada pelo aumento das temperaturas — tem agravado as condições já precárias do sistema prisional brasileiro, caracterizado por superlotação, falta de ventilação, escassez de água e infraestrutura insuficiente. O diagnóstico consta em uma nota técnica da Defensoria Pública da União (DPU), que classifica a chamada violência térmica como uma forma de tratamento desumano e degradante, em violação aos direitos humanos.
Elaborado no contexto da COP30, que foi realizada em Belém, o documento reforça o compromisso institucional da DPU com a defesa das pessoas privadas de liberdade e busca ampliar o reconhecimento da violência térmica como parte das desigualdades e do racismo ambiental no país. “A DPU visa contribuir para a construção de uma agenda nacional de justiça climática que inclua o sistema prisional brasileiro”, afirma o texto.
Conceito de violência térmica
A DPU define violência térmica como a exposição prolongada e involuntária a temperaturas extremas, capazes de comprometer a saúde e a vida dos presos. O documento destaca que tanto o calor excessivo quanto o frio intenso ferem garantias constitucionais, incluindo a vedação à tortura e às penas cruéis.
A falta de ventilação, o acesso limitado à água potável, a ausência de espaços adequados para banho de sol e o excesso de pessoas por cela amplificam os riscos. Para a Defensoria, o acúmulo desses fatores transforma o ambiente prisional em espaço insalubre, intensificando o sofrimento físico e psicológico dos custodiados.
Superlotação agrava cenário
Dados de 2024 da Secretaria Nacional de Políticas Penais (Senappen) mostram que o Brasil possui cerca de 1.386 unidades prisionais, com capacidade para 489.991 pessoas. No entanto, 668.570 detentos ocupavam celas físicas naquele período, resultando em um déficit superior a 173 mil vagas.
No Rio de Janeiro, o quadro é ainda mais crítico. Segundo a Secretaria de Administração Penitenciária (Seap), o estado abriga cerca de 46 mil presos em 24 unidades. O déficit atual é de 17.455 vagas, e deve dobrar nos próximos três anos, chegando a mais de 35 mil. O governo estadual afirma não dispor dos R$ 1,4 bilhão necessários para cumprir metas impostas pelo STF, que incluem a construção de novas unidades e a redução do déficit.
A nota técnica ressalta que, apesar do aumento gradual de vagas, as medidas adotadas pelo poder público não acompanham o ritmo acelerado do encarceramento no país.
Tratamento degradante
Para a DPU, a combinação entre superlotação, insalubridade e ausência de controle térmico configura maus-tratos e tortura, ao impor sofrimento físico e mental grave às pessoas privadas de liberdade — sem finalidade legítima dentro do sistema penal.
Medidas propostas
O órgão apresenta uma série de recomendações para enfrentar o problema:
- elaboração de cronogramas estaduais para realização de perícias térmicas nos presídios;
- suspensão de obras sem estudo prévio de impacto térmico;
- revisão das normas de arquitetura e infraestrutura de unidades penais;
- fornecimento de vestimentas adequadas ao conforto térmico;
- implementação de medidas de climatização e circulação de ar;
- oferta contínua de água potável, adequada ao clima de cada região.
A DPU defende que essas ações sejam incorporadas à agenda nacional de justiça climática, destacando que a crise ambiental intensifica vulnerabilidades históricas dentro do sistema carcerário brasileiro.
Leia também:













Deixe um comentário