Demarcações das terras indígenas desafiam governo na COP30: "A Resposta Somos Nós" - Estado do Pará Online

Demarcações das terras indígenas desafiam governo na COP30: “A Resposta Somos Nós”

Em meio à conferência climática, povos originários do Brasil e do mundo transformam Belém em palco de rituais, reivindicações e pressão política por demarcações.

Bruno Peres / Agência Brasil

Cânticos e rituais que ecoavam desde cedo deixaram claro que a Marcha Global dos Povos Indígenas não seria apenas mais um ato paralelo à COP30 nesta segunda-feira, 17. O movimento partiu da Aldeia COP, na Escola de Aplicação da UFPA, e seguiu por Belém até o Bosque Rodrigues Alves, reunindo povos de diferentes continentes e tradições. A percepção entre os participantes era de que havia milhares de pessoas, mesmo sem números oficiais divulgados pelos organizadores.

Para muitas lideranças, o tamanho da marcha ultrapassava qualquer contagem. A crença era de que os espíritos ancestrais também caminhavam junto, fortalecendo a mobilização que se espalhou pela cidade.

O ato, guiado pelo lema A Resposta Somos Nós, estruturou suas cobranças em cinco eixos centrais: reconhecimento territorial como política climática; desmatamento zero; proteção a defensores; acesso direto ao financiamento climático; e participação real nas decisões da COP.

Durante o percurso, o coordenador executivo da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), Kleber Karipuna, destacou a força histórica do encontro. “Do outro lado está o pessoal lobista do petróleo, da mineração, do agronegócio, do setor privado que tentam retirar os nossos direitos. Eles conseguem colocar muito mais gente aqui e fazer muito mais lobby do que nós, povos indígenas. Continuamos resistindo para ter mais dos nossos nos espaços e nas negociações oficiais”, afirmou.

Karipuna foi direto sobre o principal ponto de pressão: “O que a gente quer é o avanço das demarcações e homologações das terras indígenas. Ao fazer isso, o governo federal vai sinalizar de que lado efetivamente está”.

A ministra dos Povos Indígenas, Sônia Guajajara, caminhou entre os manifestantes antes de subir ao carro de som. Emocionada, assegurou que novas oficializações de territórios estão próximas. “O presidente Lula, ainda nessa COP, vai fazer mais um gesto para avançar com a demarcação de terras indígenas. E nós vamos sair daqui, sim, com portarias declaratórias e com territórios marcados”, declarou.

O ministro da Secretaria-Geral da Presidência da República, Guilherme Boulos, defendeu Guajajara diante das críticas pela demora nas homologações. “A gente sabe que ainda precisa fazer mais. E é muito bom que vocês tragam aqui hoje essas reivindicações de todas as homologações necessárias. Vocês sabem que isso não depende só da Sonia. Passa pelo Ministério da Justiça, passa pela análise técnica e nem sempre acontece no tempo que a gente gostaria”, afirmou.

Ele acrescentou: “Nós falamos com o presidente Lula e ele assumiu o compromisso de que nós vamos ter nas próximas semanas novas homologações de terras indígenas e novas portarias declaratórias para territórios indígenas nesse país”.

Entre os manifestantes, a presidente da Associação Indígena Apiaká Iakunda’Y, Irleusa Robertino, reforçou que a luta pela regularização é antiga e segue marcada pela pressão de atividades ilegais. “É uma luta que existe há muitas décadas. Apesar de o governo ter demarcado algumas áreas, a gente ainda luta para a demarcação total do nosso território, para poder continuar preservando tudo que existe ali. Existem muitas invasões dos madeireiros e convivemos com a prática ilegal da mineração”, disse.

Ela levou o neto de cinco anos para a marcha e explicou o significado simbólico do gesto. “Este momento aqui é importante para dizer a eles que são o futuro e a semente da nova geração. E eles estão aqui para levar esse legado dos mais velhos até os que virão no futuro. Não existe indígena sem luta”, afirmou.

A presença internacional também marcou o ato. Do povo Minahasa, da Indonésia, Calvin Wisan falou sobre as dificuldades de manter práticas culturais diante de estruturas coloniais ainda presentes. “A religião considera nossas práticas como demoníacas. Meu povo agora está tentando lutar não apenas contra mineração ou indústrias extrativistas, mas também contra o vandalismo. Eles vandalizam nossos artefatos, nossos locais sagrados”, relatou.

A filipina Joan Carling, da Indigenous Peoples Rights International, reforçou o apelo contra a violência territorial. “Como povos indígenas, nossas terras não estão à venda. Nossos direitos não são negociáveis. Precisamos de justiça climática agora. Parem de grilar terras indígenas para mineração e energia”, disse.

A marcha terminou no início da tarde, mas a mobilização continuará ao longo da COP30, com novas atividades, debates e exigências que seguem pressionando governos e empresas durante a conferência.

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