A temperatura que castiga Belém nestes dias de COP30 não passa despercebida pelo professor Hugo Fernandes, da UECE e diretor da SETEG. Delegado da ONU na conferência, ele atravessa os pavilhões entre falas técnicas, corredores lotados e um calor que se tornou parte das conversas, além dos diagnósticos climáticos.
“Eu estou com muito calor eu nem sou obrigado a andar com esse terno e vou já tirar mas para algumas situações eu uso estou com muito calor e isso é um reflexo das mudanças climáticas mas também de uma questão estrutural sobretudo nesta parte dos pavilhões e infelizmente não se repete lá nas áreas de negociação e nem na Blue Zone e isso é muito importante”, diz.
Para ele, a sensação térmica que pesa sobre os visitantes simboliza um ponto central da conferência: discutir clima num lugar que já vive o extremo.
Belém como termômetro da crise climática
Hugo cita a avaliação do meteorologista e pesquisador Carlos Nobre, que tem atuado como uma das vozes científicas mais influentes da COP.
“Carlos Nobre (meteorologista, pesquisador e professor) não é só uma autoridade no assunto mas ele está sendo um porta-voz dos resultados científicos. Ele diz que se a gente não tomar, hoje, medidas de regulação, podemos ter um aumento de 2°C na temperatura em cidades como Belém, que é dentro da floresta amazônica, uma zona tropical quente e úmida. As condições de vida podem se tornar muito difíceis, principalmente aos vulneráveis. A gente precisa lembrar que quando o acordo de Paris foi assinado as modelagens poderiam chegar a um aumento de 6°C na temperatura da Terra(…) e as modelagens variam de 2.4 a 2.8 é bem ruim não podemos admitir este cenário.”
O alerta combina cálculo climático e geografia: Belém é uma metrópole dentro da floresta tropical mais quente e úmida do planeta. Um acréscimo de 2°C poderia transformar a rotina de milhões em algo praticamente insustentável.
Pressões, avanços e o que muda na mesa de negociações
As tensões políticas também atravessam a conferência. Movimentos sociais, presença indígena e episódios de confronto afetam o ambiente diplomático, às vezes ampliando o diálogo, às vezes limitando. Hugo explica:
“Quando eu tenho um espaço de discussão que é absolutamente legítimo para o movimentos sociais como o caso dos Mundurukus, pode sim haver mudanças na dinâmica das negociações, mas quando tem uma invasão como foi na última terça-feira, aí sim pode ter uma dinâmica prejudicial. Movimentos sociais são legítimos, mas existem limites de segurança que precisam ser respeitados.”
O delegado lembra que a COP é, por natureza, plural, mas essa pluralidade exige regras para garantir que todos os debates avancem.
O que o Brasil conseguiu até agora
Mesmo antes do fim da primeira semana, Hugo destaca conquistas relevantes nas negociações.
“A primeira é que a agenda foi aprovada muito rapidamente. Parece ser algo óbvio, mas ter uma agenda aprovada rápido é muito incomum em uma COP. Então, o Brasil já começou vencendo nesse sentido. Ao todo, 111 países aceitaram compromissos em relação às ações para as mudanças climáticas. Cerca de 75% corresponde a emissões globais (…) é uma vitória muito grande”
Segundo ele, a presença de países em desenvolvimento assumindo mais responsabilidade em adaptação é um sinal positivo. A dúvida que paira sobre Belém: será a COP30 a conferência da implementação? Para Hugo, o caminho aponta nessa direção.
“Precisamos neste momento da cópia urgentemente de adaptação”, reforça.
Entre limites e avanços, a defesa do multilateralismo
O professor encerra com uma perspectiva direta: a COP não resolve tudo, avança devagar e é alvo de críticas, mas sem ela, o cenário seria dramaticamente pior.
“A gente precisa avançar precisamos melhorar muito pressionar mas sem isso que está acontecendo seria pior já estaríamos com um aumento de 2° e poderíamos chegar às sete (…) precisamos defender as COPs e o multilateralismo global.”
Nos corredores quentes de Belém, enquanto delegações alinhavam textos e números, a fala de Hugo Fernandes ecoa um ponto central da COP30: a ciência está sobre a mesa e o tempo, cada vez mais, não está.












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