De Brundtland à Amazônia: território de transição climática e sustentabilidade socioambiental - Estado do Pará Online

De Brundtland à Amazônia: território de transição climática e sustentabilidade socioambiental

Há poucos meses do início da COP 30, pesquisador paraense propõe que Altamira seja transformado em um Território de Transição Climática e Sustentabilidade Socioambiental.

Terra Indígena Trincheira- Bacajá, do povo Xikrin, enfrenta invasões de madeireiros e grileiros.
Terra Indígena Trincheira- Bacajá, do povo Xikrin, enfrenta invasões de madeireiros e grileiros. Foto: Helena Palmquist/Ascom/MPF-PA

Por Prof. Sociólogo, Dr. Manoel Alves da Silva

O relatório Nosso Futuro Comum, publicado em 1987 sob a liderança de Gro Harlem Brundtland, então primeira-ministra da Noruega, foi um marco na compreensão de que o desenvolvimento econômico, a justiça social e a preservação ambiental devem caminhar juntos. Foi nesse documento que se consolidou o conceito de desenvolvimento sustentável como aquele capaz de atender às necessidades do presente sem comprometer as gerações futuras (CMMAD, 1987). Essa visão integrou a crise ambiental à crise social e econômica, reconhecendo a interdependência entre os povos, os ecossistemas e os modelos de produção.

Mais do que um alerta, o relatório propôs uma nova ética global, baseada na cooperação, na equidade e na responsabilidade compartilhada sobre o planeta, colocando as futuras gerações no centro das decisões políticas e econômicas.

Agora, quase quatro décadas depois, a realização da COP 30 em Belém, no coração da Amazônia, representa a oportunidade histórica de atualizar os compromissos do Nosso Futuro Comum em um dos territórios mais estratégicos para a estabilidade climática do planeta. A floresta amazônica, historicamente tratada como fronteira de expansão econômica predatória, deve ser reconhecida como epicentro de uma transição climática justa e de um novo modelo de sustentabilidade socioambiental. Isso implica valorizar os territórios e os povos da Amazônia, apoiar cadeias produtivas regenerativas, promover justiça climática e integrar soluções urbanas e rurais para enfrentar as desigualdades históricas. A COP 30 pode, portanto, reafirmar a Amazônia como símbolo vivo de que um futuro comum, justo e sustentável é não apenas necessário, mas possível — e começa agora.

Nesse contexto, Altamira ocupa um lugar central na história recente da Amazônia. Marco da ocupação incentivada pela ditadura militar com a construção da Rodovia Transamazônica (BR-230), a cidade tornou-se símbolo das contradições do modelo desenvolvimentista imposto à região. Hoje, Altamira é simultaneamente o polo de maior produção de cacau do Brasil (IBGE, 2023) e um território de graves conflitos socioambientais e climáticos, com altos índices de desmatamento, queimadas e emissões de gases de efeito estufa — em 2022, foi o segundo município que mais emitiu CO₂ no país, segundo o SEEG/Observatório do Clima. Ao mesmo tempo, é um espaço de enorme diversidade étnica, cultural e ecológica, com povos indígenas, comunidades ribeirinhas, quilombolas, agricultores familiares e juventudes urbanas protagonizando experiências de resistência e inovação.

Nossa proposta é transformar Altamira em um Território de Transição Climática e Sustentabilidade Socioambiental, promovendo sistemas agroflorestais, agricultura de baixo carbono, bioeconomia da sociobiodiversidade, cadeias produtivas sustentáveis com verticalização da produção, fortalecimento da agricultura familiar, empoderamento das mulheres e participação ativa da juventude. Altamira pode ser o exemplo concreto de que é possível conjugar floresta em pé, justiça social e economia regenerativa no coração da Amazônia.

Referências:

Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (CMMAD). Nosso Futuro Comum. Relatório Brundtland. ONU, 1987.

IBGE (2023). Produção da Pecuária Municipal – cacau (em amêndoa).

SEEG – Sistema de Estimativas de Emissões de Gases de Efeito Estufa. Emissões por município, 2022. Observatório do clima

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